domingo, 7 de setembro de 2008

Aventuras de um coroa de alma selvagem parte 2:



Minha preocupação era não conseguir retirar a Guzzi na sexta e ter que deixá-la passar o fim de semana fervendo no páteo da polícia rodoviária, sem contar que minha segunda-feira iria pro espaço. Acordei cedo e deixei os documentos no despachante, que prometeu entregar tudo pago e em dia até as 14:00 hs. Percebam com o Detran pode ser rapido às vezes.... O proximo problema a resolver seria de que modo chegar até o posto antes do fim do dia, a 250 km de distância saindo de Sampa ás 14:00. Pensei em pedir para algum amigo, filho ou para Flavia, minha mulher. Cheguei a falar com meu filho mais velho, Arturo, que estava com o dia sussa e se dispôs a me levar, mas acho sacanagem pedir para alguém gastar uma tarde inteira, rodar 500 km, passar por 8 pedágios na ida e 8 na volta e voltar sozinho, pegando o rush do fim-de-dia. Isso é favor que se pede para inimigo, penso eu. Por outro lado, de ônibus demoraria muito, sem contar o tempo de chegar em algum ponto de embarque.

Então fiz meu plano: chegar até um posto de gasolina na rodovia e de lá dar um jeito de chegar mais rápido do que de onibus. Imaginei no mínimo encontrar algum carro de empresa, com placa da região de Ribeirão Preto e pedir uma carona. Então pedi para minha mulher me levar até o despachante, onde peguei os documentos e depois me deixar no Alto da Lapa, onde começou a parte divertida e interessante da historia. Me despedi e vi Flavia se afastar em nosso Fusca 74 (na família desde zero) e esperei uns minutos na rua esperando passar algum motociclista profissional, que me deixasse no primeiro posto da Rodovia dos Bandeirantes.

Passaram uns 8 ou 10, todos com baú traseiro, que impediria garupa. Teve até um garoto que parou do meu lado, puxei papo e ele falou que se eu topasse, ele iria montado no tanque e me levaria de boa. Olhei, coçei a cabeça e recusei agradecido. Em seguida apareceu um sem baú, fiz sinal, conversei com ele e fechamos na hora: 10 reais até o primeiro BR da Bandeirantes. JOEL era o nome desse sangue-bom. O problema era que no lugar do garupa tinha uma aranha amarrando um par de botas de chuva e uma lista telefônica, mas ele disse que eu podia sentar encima. Na adrenalina, eu subi e lá foi nóiz... A cena deve ter sido hilária e só de lembrar dou risadas. Imaginem um “alemão" de 1,87, capacete integral, na garupa de uma CGzinha, se equilibrando encima de 2 galochas e uma lista, escorregando feito geleca. Pedi desculpa pro piloto e apertava meus joelhos quase na altura das axilas do coitado quando ele arrancava ou freava. Saindo do transito pesado a coisa melhorou e a gente lá, acelerando e a CGzinha gritando. O primeiro posto não chegava nunca e lá pelo km 20, o Joel ficou preocupado pois ia se atrasar demais, pediu mil desculpas e perguntou se poderia me deixar no proximo trevo, de retorno para ele.Claro que concordei, apesar de preocupado, pois ficar no meio da rodovia seria casca. Ele não quis aceitar os 10 reais, mas insisti e dei 20. Grande Joel!! Só porque me viu de capacete, jaqueta e botas, resolveu ajudar. Coisas que só motociclistas recebem a dádiva de vivenciar e poder entender...

E lá estava eu. No meio de um trevo, solzão, capacete, jaqueta e... achando tudo muito engraçado. Cada vez mais perto do meu objetivo. Uma delícia. Já estava pegando gosto pela coisa. Parecia um daqueles jogos de PS2, onde vc vai passando de fase em fase. Um detalhe: no trevo já tinha um sujeito, meio rechonchudo, pedindo carona. Me ferrei, pensei. Ah, preciso avisar que não lembro de ter pedido carona na estrada, nos últimos 30 anos, portanto, não tenho pratica nisso. Então fiquei na dúvida se ficava junto, na frente ou atrás do meu concorrente. Achei que ficar atrás seria melhor, pois sempre que a gente passa e vê alguém pedindo carona, demora um pouco para decidir se dá ou não dá, mas aí o caroneiro já ficou para trás. Resolvi então ficar uns 100 metros depois do cara e.... acertei. Em menos de 5 minutos uma pickup parou e conheci o Goiano, grande figura, outro sangue bom com ótimo papo, que me deixou num posto próximo de Jundiaí, sua cidade.

Novo lugar, nova fase. Olhava para meu relógio impacientemente enquanto ficava de olho na saída do restaurante. As pessoas chegavam nos carros e quando eu as abordava, me respondiam com um misto de estranhamento e gentileza, mas percebi que não seria fácil achar alguém que se arriscasse a me levar e ainda por cima estivesse indo na direção certa, e pelo menos a 300 km de distancia.

Já começava a me achar um idiota por não estar no ar condicionado de um lento Cometão, quando passou por mim um rapazinho com colete de Moto Clube, numa Suzuki Intruder 125 com alforges, guidom alto e caveirinha com luzes nos olhos, encima do guidom. Parou numa loja de acessórios para motos, a Suzuki Fashion. Fui até lá, me apresentei e 10 minutos depois eu estava bordo da Intruder, recostado no sissy bar, apoiando meus pés nas plataformas adptadas pelo Alex, esse cara fantástico que me ouviu e resolveu fazer 500 kms, de uma hora para a outra, levando um desconhecido grandão e pesado no meio de carretas, ônibus e carros passando a 120. Parecia que voavam...

Foi uma das melhores viagens que fiz em minha vida. Nota 10 para o conforto, 10 para o piloto e 1000 para o astral. Íamos a 100 no plano, 110 nas descidas e 90 nas subidas. Suzukinha valente, o tempo todo no gás, sem engasgar, com o escapamento gritando alegre. Adorei andar na mesma velocidade das outras 125, que são absolutas nas estradas... os longos contatos visuais com os outros motociclistas, entre as várias cidades que cruzamos... como os carros milzinhos andam depressa... como as motos grandes aparecem e somem em um instante... como elas parecem enormes. E a arte de domar as turbulências dos ônibus e carretas, verdadeiras locomotivas? Quando vc anda rápido, a moto funciona como uma faca, cortando o ar. Mas se vc está devagar não corta. Tem que lutar com paredes de vento que te estapeiam com força. Enfim, foi uma viagem fantástica, com paisagens lindas e podendo olhar para os lados o tempo todo. Viajar na garupa é irado. Paramos 2 vezes para uma Coca, esticar minhas pernas, que abertas funcionavam como freio aerodinâmico e ...pau na Intruderzinha. O nome dela é Marta, mas deveria ser Valentina. E assim fomos, subindo e descendo colinas, pegando embalo nas descidas e eu tentando não pensar na velocidade durante as longas subidas. Estávamos mais rápido do que os ônibus e isso me bastava. Chegamos com o sol quase se pondo, uma bola enorme e linda. O Alex me deixou no km 255, fizemos uma foto, trocamos um abraço de verdade e ele se mandou de volta. Grande Alex, agora somos amigos pro resto da vida. Os soldados da polícia rodoviária foram super-simpáticos, como quase sempre. Lamentaram o colega tão... intransigente e liberaram a moto em 10 minutos. Saí de lá acelerando com vontade.

Deve ter sido o sol forte, mas tive a impressão que minha moto balançou o rab... a traseira quando me viu chegar, de tanta felicidade. A volta foi simplesmente delíciosa. Os 74 cavalos pareciam 270 e eu me sentia confortável como nunca. A noite linda, a estrada perfeita e super-sinalizada, os cheiros das plantações à noite, pura delícia pura. Queria estar a mil quilometros de casa, rodar a noite toda.

E ao contrário da frustração do dia anterior, quando voltei de onibus, cheio de sentimentos negativos dentro de mim, essa volta foi inesquecível e simplesmente lavou minha alma. Saber que existe tanta gente legal e que basta estar aberto para conhecê-las, me alivia. E graças a Deus, são a grande maioria, ainda. Almas Selvagens...

E finalizando, nunca se esqueçam de verificar a documentação da moto antes de sair.

Nos vemos nas estradas. Ou no blog.

ÉNOIZ, ALEX!

2 comentários:

Unknown disse...

oiê...

literalmente, realmente...vc tem alma selvagem, e escreve como agente gosta, ñ conseguí parar de ler enquanto ñ ví: enoiz, alex! rsrsrs burocracia amigo, burrocracia! em q isso ajuda? organização? será??? bom...minha opinião!
beijão!!!

TiteGeraldo disse...

huahauahuahuahuaa, só o renzo pra viajar 200 km na garupa de uma Intruder 125. Não sei quem é mais maluco nessa história, kkk